Notoriamente, a comicidade é uma de suas marcas registradas. Carismático e extrovertido, o supertalentoso Haroldo Guimaraes é o Homem de Vitórias da vez. Ele costuma ser a alma da festa sem muitos esforços. Advogado e ator, Haroldo fala um pouco sobre sua vida particular e profissional tocando em assuntos como família, advocacia, amor, cinema, sonho e futuro. Não perde a oportunidade de fazer uma merecida e oportuna homenagem à sua esposa, declara sua amizade ao colega de trabalho Edmilson Filho em poesia recitada em programa de TV, fala da saudade do seu pai, esbanjando intelectualidade, leveza e fluidez – definitivamente representando muito bem o Ceará para todas as galáxias. Senhoras e Senhores, Haroldo Guimarães! Surpreendam-se, deleitem-se e orgulhem-se!
Quem é Haroldo Guimarães?
Alguém que tem como propósito de vida ficar mais perto da família e elevar o nome do Ceará. Sou uma pessoa normal. Gostaria de somar. Não gosto muito de aparecer em festas e eventos porque eu acho melhor estar em casa… e porque ainda não consegui me acostumar com o desejo das pessoas de tirar foto comigo. Agradeço, porque sei que é uma forma de carinho. Sempre atendo a todos os pedidos, mas ainda acho isso meio esquisito.
Como você constrói suas personagens?
Construo o personagem a partir do texto. Antes de ir provar o figurino e maquiagem e tento levar algo pra pessoa que vai surgir quando eu me ver no espelho. Vale pensar em alguém da literatura, do cinema, alguém que conheci ou até alguém que nunca vi na vida.
O que você tem aprendido sobre o ser humano no ofício de atuar?
Tenho aprendido muito; não dá nem pra citar tudo. A última coisa foi que as pessoas são muito diferentes e que a reação delas aos diversos eventos da vida é muito condicionada pela jeito delas, entende? O Munizio reage diferente do Jesus ao ser enganado, por exemplo. Mesmo que ambos tenham a mesma formação, a mesma família. Irmãos de uma mesma família são diferentes. Eu penso que esse caráter padrão de cada um deve ser achado pelo ator. Aí depois fica tudo muito mais fácil. Atuar pra mim é o estudo prático do ser humano.
O que uma estrela holliúdyana faz como passatempo?
Leitura. O Estudo é o principal elemento de transformação posto à disposição do homem, e que traz mudanças internas e sociais. Gostaria de ler todos os clássicos. Minha esposa, Cibely, e eu encontramos uma lista legal, do Harold Bloom. Iniciamos, mas paramos no primeiro, que já era bem denso e cheio de descrições. (Emma, de Jane Austen). Aprendemos que temos que ler separados mesmo. Não tem jeito, a leitura é um hábito muito solitário. Pra nossa sorte, a gente lê muito, e até alguns clássicos a gente já tinha lido. E a gente volta com essa lista. Estou lendo agora “Rápido e Devagar”, de Daniel Kahneman, que é mais científico do que literatura. É meio que um resumo de uma pesquisa dele com um amigo, que lhe rendeu um prêmio Nobel. Fala, em apertada síntese, que tomamos milhares de decisões por dia, que algumas são rápidas e sem pensar, e que outras são lentas e ponderadas. Essas rápidas se traduzem nos “vieses cognitivos”, como quando a gente prefere algo raro a algo fácil, ou algo familiar a algo estranho, e por aí vai. Me ajuda a entender a mim, às outras pessoas, aos meus personagens.
“Juazeiro” de Leonardo Bastião
Juazeiro é uma planta
Que resiste à terra enxuta
A fruta não vale nada
E a madeira é torta e bruta
Mas a bondade da sombra
Tira a ruindade da fruta
E tudo que o homem estudou,
Para a natureza foi pouco
Porque ele não faz um coqueiro?
Se inventar fica louco
Caçando a encanação
Que leva a água do chão
Pra botar dentro do coco.Poema que Haroldo recita para ilustrar a sua amizade com Edmilson Filho,
um de seus amigos, durante a entrevista dada a Pedro Bial, em 25 de abril de 2023.
Como vc tem conciliado o estrelato e ficar mais próximo da família?
Não é fácil conciliar. Mas eu tenho uma regra: por mais importante que seja o compromisso, em primeiro lugar está a Malu de 17h45 às 21h. Tem dado certo, com poucas exceções. Sou um esposo e pai em tempo integral, no sentido dos cuidados domésticos, de preparar pra levar ela à creche e ir buscá-la. Todas as tarefas profissionais é que são a pausa. Não sei até quando será assim, mas sei que na primeira infância é importante. Cibely também trabalha muito fora de casa; então, os dois temos esse combinado.
Defina “Vitória”.
Você só experimenta força após uma derrota. A derrota é generosa porque ensina. A vitória é menos generosa, pois é mero resultado. É momento de celebrar. Força ´pode vir de muito trabalho, de muito estudo…. Vitória é resultante de um acúmulo, de abundância de algo. A derrota ensina pela ausência. Te dá a chance de preencher a existência.
Pra onde você gosta de viajar?
Gostei de Nova Iorque. Quero voltar. Gosto de lá por mil fatores: é uma cidade caminhável e com distribuição de ruas previsível, um tabuleiro de xadrez, parecido com Fortaleza do Plano do Silva Paulet; também porque tem o Central Park no meio, e museus, e hospeda o mais forte no capitalismo; porque lembro das cenas de cinema que sempre fizeram e ainda fazem lá; e porque tem a Broadway, o mais forte em matéria de teatro. Um dia vou estrear na Broadway, pode escrever.
E o cinema?
Transformador, como todo veículo cultural. Modificou a percepção, por exemplo, dos meus conterrâneos com relação à própria fala e modo de ser.
Qual o papel da Advocacia na sua vida?
A profissão que, até aqui, foi a grande responsável por me bancar financeiramente, inclusive pra realizar meus sonhos artísticos. Como nem sempre foi rentável, tive com ela uma relação de amor e ódio. Hoje sou muito grato. E aprendi muito sobre as pessoas e sobre as dificuldades da vida.
Como você se posiciona com o assunto “saúde”?
Conscientizei-me e isso passou a ser prioridade pra mim. Minha filha Malu me motivou a pôr minha saúde como prioridade. Quero muito vê-la crescer. A vida é curta e bonita. Vivendo 120 ou 60 anos será pouco. Mas cada instante é infinito em si. Em significados e até em felicidade. Essa percepção eu passei a ter quando minha filha nasceu.
Podemos falar de “amor”?
Minha filha tem me ensinado sobre esse sentimento e sobre o que constituir minha família fez por mim. Tenho uma relação harmoniosa com a família. Conectar objetivos profissionais com familiares é uma grande sacada. Te leva mais longe. Então, o amor, além de preencher a vida, recompensa a vida. É o ativo mais lucrativo.
Gostaria de homenagem minha esposa. Ela tem o dom da tranquilidade, e, muitas vezes, também o da concentração e do foco. Uma mãe incrível, uma esposa perfeita. Ganhei na loteria.
Alguma grande saudade?
Definitivamente a saudade do meu pai. Hoje ela não dói mais; contudo, ela ainda está na minha carne. Eu vivo a saudade dele no meu dia a dia. Meu pai também se chama Haroldo Guimarães, falecido em 2018. Um bibliófilo, um comerciário que se formou em Direito já com duas filhas, um sindicalista que acreditava na conciliação, um amante de ouvir música. Um cara engraçado e generoso. Morreu muito pobre de dinheiro. Se achava feliz. Minha mãe, Eliedira, tá viva, com 86 anos, com muita saúde e um otimismo incrível. Uma amante de ouvir música e cantar, e até compõe algumas coisas. Um talento. Mais engraçada que o papai. E, é bom lembrar, foi e é a mãe de quatro filhos que deram muito trabalho, numa época em que as responsabilidades do pai, infelizmente, eram menores. Meu pai bebia, chegava tarde. Minha mãe sempre teve um compromisso conosco que nunca quebrou. Por isso faço questão de falar dela, mesmo quando falo do meu pai.
E o que dizer da “Felicidade”?
Você reconhece a felicidade através de uma sensação provisória ou conclui racionalmente quando olha pra sua família e amigos ao seu lado. Eu sou verdadeiramente feliz. Minha luta é para que minha família tenha ainda mais conforto e para que eu consiga ver meus amigos.
Qual o seu sonho?
Eu o estou realizando. Falta agora internacionalizar a carreira. Preciso fazer uma turnê nacional do meu show primeiro. Não está fácil, por mil motivos, como agenda e organização familiar. Depois que eu fizer isso, eu foco na carreira internacional. O plano é simples: escrever um espetáculo, pagar a pauta e divulgar. O conteúdo do show por enquanto é segredo.
Você tem medo de algo, Haroldo?
Os medos são normais do ser humano… eu tenho muitos, mas os considero salutares. Não sou de alimentar o medo. Sou de tentar remediá-los: desde a organização da minha casa aos meus hábitos, passando pela minha maneira de cuidar das finanças, eu priorizo a segurança. Isso tem me ajudado a minimizado qualquer medo ou possível insegurança.
O que traz o futuro?
A visão que eu tenho é ter mais tempo de qualidade com minha família e amigos, no âmbito pessoal, e no profissional, a internacionalização da carreira.
Quais prêmios você destaca na sua vida artística?
Dois. Um deles, em 1993. Edmilson Filho e eu vencemos aquele que era o maior festival de humor do Ceará. O outro, em 2000, quando recebemos uma homenagem no Shopping Pizza. Mas devo enfatizar que o reconhecimento do meu trabalho pelo público é a maior premiação, e o que tem garantido trabalho, algo tão caro para quem vive da atuação. Eu sou muito grato e consciente da importância desse reconhecimento.
Qual o legado que você quer deixar através de seu trabalho?
Quero deixar o legado de alguém que se transformou e transformou pelo estudo e pelo trabalho. Depois disso, se eu puder ficar como alguém que representou o Ceará com seu trabalho, eu fico muito feliz. Mas o exemplo do esforço é o melhor. Família é o maior incentivo e para o que você trabalha.
CONVERSA DE AMIGOS
Você tem uma música que o defina ou lhe seja significativa? Fale-me um pouco dela.
“Anunciação” de Alceu Valença, por vários motivos, é hoje a resposta obrigatória pra sua pergunta. Vamos por partes. Parte 1: Eu tenho uma banda que tocava no carnaval e no pré-carnaval de Fortaleza e, antes da moda que colocou essa canção em evidência de novo [ela é de 1983], eu abria o show com ela, e sempre funcionava muito bem. Parte 2: É uma das canções que cantávamos antes da Malu nascer junto à barriga da Cibely. Hoje, cantamos pra ela dormir. Malu diz que é a música dela. Parte 3: “Anunciação” é um dos temas de Cine Holliúdy em sua terceira temporada, em uma versão exclusiva do violão de Alceu com a guitarra de Paulo Rafael, falecido dois meses após a gravação da mesma. A “música da Malu” é a musica da série! Parte 4: É uma linda música de sotaque forte, a cara do Nordeste, cuja letra anseia a espera por algo melhor para a família e amigos, e de algo que está bem próximo de chegar. E é isso que está para acontecer – o melhor pra todos nós. Eu tenho certeza. É isso. Um cheiro.
CINE HOLLIÚDY
Receita para uma série superdivertida: misture suspense, terror, magia, ficção, super-heróis e cangaço, acrescente muita comédia a tudo isso e o resultado é a terceira temporada da série “Cine Holliúdy” em 12 episódios, todas as quintas-feiras, logo após “Travessia” na TV Globo.
O PODER DO SONHO – Simplesmente ninguém acreditaria se alguém dissesse, há alguns anos, que um curta-metragem em torno de um proprietário de cinema no interior do Ceará, na década de 70, falado em “cearencês”, se tornaria dois longas e uma série de TV, na Globo. Pois aconteceu! Tudo começou em 2001, com o curta “Cine Holiúdy – O astista contra o caba do mal”. Depois veio o longa-metragem “Cine Holliúdy”, em 2012, e a sequência “Cine Holliúdy 2: A Chibata sideral”, em 2018. A primeira temporada da série estreou na Globo há quatro anos. O Filme e a série foram reconhecidos, em 2014 e 2020, no Prêmio do Cinema Brasileiro, na categoria de “melhor longa-metragem de comédia” e “melhor série de ficção da TV aberta”, o que definitivamente tem trazido maior frescor à cinematografia brasileira, por apontar para outros estados, artistas, talentos e possibilidades na construção de um sonho.